O que importa é mostrar que a empresa está na jornada para trazer, cada vez mais, as diretrizes ESG para suas governança, gestão e público de relacionamento. É fato que, cada uma delas estará em “estágios” diferentes nesse caminho, mas o mais importante é segui-lo buscando o crescimento das ações e dos impactos positivos para o planeta, as pessoas e os negócios.
Ana Paula Arbache PhD em Educação
Como promover o crescimento econômico com desenvolvimento sustentável?
Esse é o chamado que a Organização das Nações Unidas (ONU) tem feito, desde 1972 em Estocolmo, na Conferência sobre o Desenvolvimento e Meio Ambiente Humano. Naquela ocasião,113 países estiveram presentes e foi um marco na discussão dos problemas ambientais.
A Declaração de Estocolmo é um desdobramento do evento e determina 26 princípios que orientam o tema e que propiciou a origem do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA).
O documento já alertava ao mundo, naquela época, de que não era possível continuar no mesmo ritmo com relação aos cuidados com o meio ambiente e que era preciso olhar para os recursos do planeta com mais cautela. Para isso, o documento orientava a necessidade de mudança no modo de fazer negócios e de se viver.
Na década de 1970, iniciou-se a ideia do desenvolvimento sustentável e, em 1987, esse conceito foi disseminado com a publicação do documento “Nosso futuro comum – Our Common Future”, também conhecido como Relatório de Brundland em 1987. Por meio do Relatório de Brundland, o conceito de desenvolvimento sustentável ganhou visibilidade e foi definido como “a utilização dos recursos para atenderem às necessidades do presente sem comprometermos a possibilidade das futuras gerações em atender às suas próprias necessidades”. (BRUNDTLAND, 1987, apud INSTITUTO ECOBRASIL n.p).
O Documento trazia possíveis soluções e metas que deveriam ser consideradas pelos governos, para que fosse possível conciliar o binômio: crescimento econômico com desenvolvimento sustentável e esse, era o maior desafio!
A pobreza no terceiro mundo, o consumismo elevado nos países de primeiro mundo, o aquecimento global, as chuvas ácidas, a destruição da camada de ozônio ganharam destaque para que se pudessem pensar em soluções, metas e medidas para conter danos ao meio ambiente e à população.
De lá para cá, houveram encontros globais que geraram documentos que marcam o compromisso de governos, empresas e instituições da sociedade civil para concretizar medidas focadas no tema, como é o caso da Agenda 2030, que traz os 17 objetivos do desenvolvimento sustentável e tem 192 signatários, incluindo o Brasil.
Como chegamos até ESG?
- CNUMAH – Estocolmo 1972
- CNUMAD – Rio 1992
- Cúpula da Terra – 1992
- Cúpula do Milênio – ODM
- Fórum de Davos 1999
- Pacto Global 2000
- CNUMAD – Rio +20 – 2012
- UNFCC – COP 21 – Acordo de Paris – Agenda 2030 – ODS – 2015
- Agenda 2030 – (passa a vigorar) 2020
- COP 26 – 2021 – Compromisso Global do Metano
Fonte: Adaptado Artigo de pós-doutoramento da Autora: ARBACHE, Ana. Educação para o Desenvolvimento Sustentável: orientação para o possível do postulado ecológico político crítico da Vida Perpétua. Departamento de Educação – Currículo. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2006. Imagem apresenta em seminário de ESG ministrado pela autora em 2021 pela Arbache Innovations.
ESG: como tudo isso chega ao ambiente financeiro?
A publicação do Pacto Global chamada “Who cares wins” em 2004, conta com uma provocação do então secretário-geral da ONU, Koff Annan, a 50 CEO’s de grandes instituições financeiras, a respeito de como integrar as questões sociais, ambientais e de governança no mercado de capitais. A provocação convidava as lideranças a integrarem as premissas ESG no mercado financeiro, originando a criação do PRI (Princípios para o Investimentos Responsáveis), realizado sob a iniciativa da ONU.
Não por acaso, na ocasião da 21a Conferência das Partes (COP 21) sobre Mudança do Clima (UNFCCC), realizada em dezembro de 2015, na qual a Agenda 2030 foi elaborada, cerca de 5 mil bancos e empresas estiveram presentes.
O objetivo do evento foi compreender e alinhar as estratégias de governança às diretrizes da Agenda 2030, para que estivessem aptas a “exercer o crescimento econômico inclusivo, sustentável, com padrões de produção e consumo, aliados ao uso responsável dos recursos naturais do planeta” (ARBACHE, 2016).
Qual foi então o ponto pivô que acelerou a agenda 2030 no mercado financeiro?
De 2004 para cá, muita coisa mudou. A sociedade e os consumidores já estão mais engajadas no tema da sustentabilidade, uma vez que: (a) O planeta sofre com os impactos das mudanças climáticas; (b) os consumidores estão alertas em relação à reputação das organizações, devido aos sucessivos escândalos de corrupção e desastres ambientais; (c) a comunicação distribuída pelos diferentes canais da internet expõe e fragilizam as governanças de empresas e instituições que não estão sendo responsáveis; (d) tudo isso aumenta os riscos em torno dos investimentos dessas empresas, nas mesmas e colocando em questão a sua própria competitividade e sobrevivência.
A Carta de Larry Fink CEO da Black Rock aos CEO’s de grandes empresas, redefine e reestrutura o jeito de fazer negócios. Ao liderar uma das grandes empresas que gerencia mais de U $6,7 trilhões em ativos, Fink traz potência para a mudança, dizendo que não só vai parar de investir em negócios que não atendam às premissas ESG, como também vai desinvestir em negócios que não atendam a elas, impulsionando e influenciando todo o mercado a segui-lo. Na carta escrita por Fink, há pontos que precisam ser considerados pelas organizações, como:
[…] fazer da sustentabilidade uma parte integrante da construção do portfólio e da gestão de risco; desinvestir daqueles com alto risco de sustentabilidade, como os produtores de carvão para termelétricas; lançar novos produtos de investimento que filtrem os combustíveis fósseis; e fortalecer nosso compromisso com a sustentabilidade e a transparência em nossas atividades de gestão de investimentos. FINK (2022).
Os investimentos ESG atraíram diferentes setores que buscam fazer essa transição para economias mais verdes e de baixo carbono, como indica a OCDE (BOOF. R & PALANO, 2020 apud ARBACHE, 2021).
Para a Organização, isso acima está acontecendo de modo acelerado para responder às demandas do mercado. Alguns dilemas estão presentes nesse caminho, como: a definição de classificações e métricas capazes de gerar materialidade às práticas e confiabilidade aos resultados. No entanto, isso não impediu que cerca de US $17,5 trilhões fossem investidos globalmente.
Imagem 06: Uma nova governança e seus agentes
Fonte: A autora. In: Seminário de ESG apresentado pela autora para empresa francesa, pela Arbache Innovations, 2021.
O mundo financeiro sabe que pode lucrar com a agenda de sustentabilidade, desde que tenha ambição, audácia e inovação. Os trilhões de dólares disponíveis para os investimentos em negócios que seguem as diretrizes ESG pedem compromissos sérios com uma nova economia e, para isso, não dá para fazer o famoso “mais do mesmo”.
Cerca de 22 países já emitiram emissões de títulos públicos ligados ao ESG e instrumentos financeiros estão sendo criados para viabilizar a captação de capital para financiar atividades sustentáveis.
A corrida para o “outro verde” coloca o capitalismo atual, frente a frente com o desafio de buscar novos modelos para os negócios, como por exemplo, os modelos da economia circular e o modelo Doughnut.
As finanças com base em ESG trazem os seguintes Títulos: verdes, sociais, sustentáveis (combinação de verde e o social) e vinculados à sustentabilidade, também conhecidos como: Green, social, sustainability e sustainability-linked bond (SLB).
Os SLB são instrumentos de dívida, cujo objetivo é fazer com que o emissor alcance metas de sustentabilidade que são monitoradas periodicamente. Eles podem ter suas características alteradas caso atinjam, ou não, as metas estabelecidas nas datas para verificação.
Quando as metas não são atingidas, o investidor pode receber uma remuneração maior do que a estipulada no momento do lançamento do título e isso aumenta o custo para o emissor.
Em setembro de 2021, a B3 se tornou a primeira bolsa de valores no mundo a emitir o sustainability Linked Bond no valor de US $700 milhões de dólares, passando a se comprometer financeiramente com a sustentabilidade. A instituição se comprometeu a criar um índice de diversidade para o mercado brasileiro e o aumento de mulheres em cargos de liderança dentro da Bolsa. Caso ela não cumpra a meta estabelecida de ter 35% de mulheres em cargos de liderança até 2026, os juros serão acrescidos de 0,125% a partir do pagamento do cupom de 2027.
Há um processo de transição ocorrendo e as empresas buscam se adequar a essa nova realidade. Por isso, é preciso compreender como as diretrizes ESG podem ser aliadas das estratégias de negócios.
Cada empresa e organização poderá definir quais serão suas metas e indicadores e como devem buscar o desempenho esperado. Tudo isso deve ser feito com transparência e com uma comunicação honesta, pois somente assim, haverá a credibilidade que resguarda a boa reputação corporativa e os bons investimentos!
O que importa é mostrar que a empresa ou organização está na jornada para trazer, cada vez mais, as diretrizes ESG para sua governança, gestão e público de relacionamento. É fato que, cada uma delas estará em “estágios” diferentes nesse caminho, mas o mais importante é segui-lo buscando o crescimento das ações e dos impactos positivos para o planeta, as pessoas e os negócios.
Veja abaixo como uma cooperativa de crédito está concretizando a sua agenda de sustentabilidade e evoluindo para as diretrizes ESG. O Projeto Moedinha mostra como a cooperativa leva impacto positivo para a comunidade:
Sicoob Cocre: Projeto Moedinha: 2019 a 2022
“As crianças e os pais receberam, de forma lúdica, informações importantes sobre Educação Financeira, um dos pilares mais fortes do Cooperativismo, em um formato inovador, adaptado à nossa nova realidade”, conta o CEO Sicoob Cocre, Nivaldo José Camilo de Oliveira (2022).
O projeto:
Iniciado em 2019, o Projeto Moedinha foi criado e aplicado pela Cooperativa de Crédito Sicoob Cocre, com o objetivo de disseminar a educação financeira para crianças de escolas públicas da região de Piracicaba e Mogi Mirim, bem como para formar educadores da rede pública e os colaboradores da Sicoob Cocre em torno da temática. O projeto “Caio tem uma Moedinha” coaduna com o Programa Financinhas do Instituto Sicoob e consta em seu relatório de sustentabilidade, no qual constam os indicadores de impacto e a evolução do projeto dentro do Instituto e podem ser vistos no seguinte endereço: Relatório de Sustentabilidade. http://www.sicoobcoopere.com.br/wp-content/uploads/2021/04/Relatorio-de-Impacto_2020_InstitutoSicoob-1.pdf. Acesso em junho de 2022.
Em relação a agenda de sustentabilidade – Agenda 2030 – o projeto aqui descrito corresponde ao atendimento do ODS 4: educação de qualidade e ODS 10: Redução das desigualdades. Por conta disso, os impactos gerados pelo Projeto “Caio tem uma moedinha”, podem ser incorporados aos indicadores ESG da cooperativa em seu relato para os stakeholders.
Período: 2019
Iniciado em 2019, o Projeto Social “Moedinha” continua em 2022.
- Os objetivos do projeto são:
Levar educação financeira, cooperativista, ambiental e de cidadania às crianças de 04 a 10 anos de idade, alunas de escolas públicas estaduais da região de Piracicaba.
Formar educadores de escolas públicas estaduais da região de Piracicaba, disseminando o conteúdo do cooperativismo e educação financeira.
- Descritivo:
Desenvolvimento de peça teatral “Caio tem uma Moedinha”, advinda do livro da Coleção Financinha do Instituto Sicoob. A peça foi elaborada e encenada pela Agência NCasting, exclusivamente para o projeto do Sicoob Cocre e foram feitas 06 apresentações presenciais do teatro infantil e 03 oficinas para formadores.
- Impacto:
1500 crianças receberam educação financeira, cooperativista, ambiental e de cidadania via peça teatral e materiais que foram destinados às escolas públicas envolvidas no projeto para que os educadores pudessem abordar o tema durante todo o ano letivo.
50 educadores foram formados no projeto.
- Investimento do Sicoob Cocre no Projeto:
R$ 50 mil reais
Período: 2020
O projeto teve a sua continuidade em 2020, mesmo com as restrições da pandemia o Sicoob Cocre promoveu as seguintes ações:
- Descritivo:
Apresentação da peça teatral “Caio tem uma moedinha” em 04 sessões que ocorreram no Drive-in no Sindicato dos Metalúrgicos de Piracicaba.
Aulas show on-line para os educadores, ministradas pelo Me. Yuri Reis em setembro de 2020.
Formação on-line dos funcionários da Sicoob Cocre em educação financeira.
- Parceria
Na ocasião das apresentações teatrais a Sicoob Cocre estabeleceu uma parceria para arrecadar fundos para a Avistar (Associação de atendimento a pessoas com deficiência visual de Piracicaba), por meio da inscrição no evento.
Período: 2021: o projeto foi interrompido em decorrência do período pandêmico e por decisão estratégica da Sicoob Cocre.
Período 2022: Em setembro de 2022, o projeto será realizado em Piracicaba e Mogi Mirim.
Harmonizar a estratégia, com a capacidade de entrega das ações em torno das diretrizes ESG é a grande inteligência dos líderes. É preciso alinhar os interesses da Agenda mais ampla de sustentabilidade que é a Agenda 2030, às diretrizes ESG, que tem como foco a sustentabilidade do negócio.
Assim, alinhar desenvolvimento sustentável com crescimento econômico será um diferencial para as lideranças. O projeto, como o que vimos acima, é significativo, na medida em que cumpre muito bem os preceitos das duas agendas e trazem diferentes stakeholders para impactar e serem impactados pelas ações ESG da cooperativa.
Vale ressaltar que o projeto foi apresentado pelo CEO da cooperativa no evento Cocre Week em março de 2022, no painel ESG mediado pela autora.